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11 setembro 2005

Avaliando o Ser Holístico

Avaliação é um tema complexo e muito discutido entre profissionais de educação, porém acredito que antes de falar sobre metodologias é necessário discutir e deixar claro a visão de homem que permeia a educação e que cada profissional adotou para si, pois só depois que esta questão estiver clarificada que avançaremos na discussão sobre avaliação.

Se a visão de homem predominante é de um homem pré-determinado, se o professor acha que a inteligência é inata, que se um indivíduo nasceu com uma limitação ele está fadado a não aprender, que precisa ser segregado, pois existem os inteligentes e os não inteligentes, os aptos e os não aptos, se acredita que o ser humano tem uma maldade inerente, que precisa ser educado, reprimido, controlado, então irá ter uma determinada visão de educação e conseqüentemente de avaliação.

Agora se ele acredita que o ser humano é inerentemente bom, que a criança precisa desenvolver-se naturalmente, espontaneamente e que o professor tem um papel limitado, então irá ter outra visão de educação e avaliação.

No entanto se acredita que o ser humano é um ser de possibilidades, que os indivíduos estão sempre construindo e reconstruindo sua história, então lançará outro olhar sobre o aluno, conseguirá perceber que as peculiaridades, as características biológicas dos indivíduos são muito importantes, mas não são determinantes, pois a influência do meio social, a influência da família, da escola, das aulas ministradas, da relação interpessoal entre aluno e professor, do vínculo também são muito importantes, e principalmente que o aluno não é passivo nesse processo, que ao contrário, recebe tudo isso e reage, ele é influenciado pelo meio mas também influencia, é transformado e também transforma. Quando conseguirmos lançar esse olhar e ver o ser humano como um ser holístico, quando conseguirmos perceber o todo, então a visão de educação será outra e a forma de avaliar também.

A avaliação envolve um verdadeiro sentimento de compromisso com o outro. Podemos fazer analogia desse sentimento de compromisso com um casamento, pois a partir do momento em que duas pessoas se casam elas passam a ter um sentimento de compromisso muito maior com a outra pessoa, um sentimento de responsabilidade, passa a ter mais tolerância às dificuldades do outro, e quando essas dificuldades aparecem busca-se conversar, explicar a situação, ajudar e compreender o outro, assim acontece quando se tem um sentimento de compromisso com o aluno, passamos a sentir responsabilidade sobre seu aprendizado, passamos a compreender e tentar ajudá-lo em suas dificuldades pois existe um forte vínculo.

Avaliar envolve responsabilidade com a aprendizagem do aluno pois é necessário sermos cônscios de que a avaliação não tem o intuito de classificar, de punir, de construir barreiras e sim de clarificar e de ajudar. A avaliação precisa ser feita voltada para o futuro, para o que o aluno pode vir a ser, esse deve ser o principal objetivo e é, a partir dele, que vamos mudar as metodologias, tentar novamente. Se acreditarmos que o ser humano é um ser de possibilidades, saberemos que vale a pena tentar de novo e acreditar no potencial de cada um.

Nessa perspectiva o educador segue um princípio ético pois seu compromisso é com todos os alunos. É de extrema importância que o professor compreenda que aprender é muito mais que decorar conteúdos, que decorar datas e fórmulas, que a aprendizagem envolve mudança de comportamento, que aprender é saber e criticar os valores da cultura em que se está inserido, é ler o mundo à sua volta, pois dessa forma a avaliação do professor será uma avaliação que compreende o todo. É necessário que o professor reconheça e valorize cada "pequeno passo", que se reconhecidos e valorizados serão na verdade um grande salto qualitativo na existência do aluno. Assim por exemplo, uma criança com deficiência mental que não aprendeu a ler mas que aprendeu que no meio social é necessário pedir licença, desculpa, por favor, ou que aprendeu que não pode tirar a roupa na sala de aula teve um grande aprendizado e o professor saberá reconhecer o valor dessa aprendizagem, pois ele avalia o ser humano como um todo.

Não estou com isso fazendo apologia à não aplicação de provas ou exercícios pois compreendo que eles são extremamente necessários, simplesmente coloco que isso não avalia o ser humano como um todo e que o resultado dessas provas e exercícios devem ser usados a favor do aluno, para compreender onde ele necessita de mais auxilio e não como forma de punição. O aluno não deve ser avaliado só na semana de provas, e sim da hora que ele entra no colégio até a hora que sai, em todos os dias do ano. A avaliação acontece no recreio, nos exercícios, na hora do lanche... e o professor cria várias oportunidades para o aluno demonstrar sua aprendizagem.

Há muita resistência por parte dos profissionais e da família quanto a essa nova forma de avaliar, no entanto acredito que quando a visão de homem for trabalhada essas dificuldades serão sanadas, pois passaremos a acreditar que o ser humano é um ser de possibilidades.